Quem nunca sonhou em conhecer a milenar cidade e seus românticos canais? Impossível não se emocionar com tanta beleza e história. A primeira vez que estive em Veneza confesso que fiquei meio abobalhado diante do que meus olhos viam. Jamais havia imaginado que existisse um lugar como aquele com tantas obras-primas da arquitetura, igrejas cobertas com ouro, mosaicos e afrescos de valor inestimável.
Com tanta arte ao redor, parei várias vezes para observar e pensar como teria sido aquele lugar há mais de mil anos. Que muita gente viveu, morou e trabalhou naquelas 118 ilhotas banhadas por mais de 150 pequenos canais. Como viviam dentro daqueles prédios encantadores que agora afundam lentamente nas águas da lagoa. Um filme imaginário rodou em minha mente sobre o dia a dia dos venezianos. Homens, mulheres e crianças frequentando as igrejas, cruzando as mais de 400 pontes e se encontrando na Praça de São Marco (Piazza di San Marco), o coração do lugar.
E quantas pessoas como eu já não atravessaram o mundo para conhecer e vivenciar a cidade das gôndolas, verdadeira joia do cenário turístico italiano. Turistas que também se encontram na São Marco para curtir as obras de valor inestimável no seu entorno. Basta fazer uma foto panorâmica para registrar uma imagem com a torre do sino da Basílica e suas cinco entradas de mármore e preciosos mosaicos; o Palazzo Ducale, símbolo da República Sereníssima, nome pelo qual ficou conhecida porque foi a única cidade italiana que não teve batalhas sangrentas ou pilhagens; a Torre do Relógio, a obra-prima de engenharia que marca o tempo no destino por séculos; e a Ala Napoleônica, que abriga os museus Correr e o Arqueológico de Veneza, além da Biblioteca Marciana e suas salas monumentais.
Sem dúvida, um lugar diferente de todas as outras cidades que você já conheceu. Um lugar para parar e sonhar – de preferência sentado tranquilamente em um dos diversos cafés com vista para a praça histórica e tomando um legítimo expresso italiano. Se escolher o Caffé Florian melhor. O mais antigo café da Itália, inaugurado em 1720, é charmoso e elegante. A decoração do seu interior impressiona pela beleza, obras de arte e espelhos. Suas mesas já foram ocupadas por personalidades como Giacomo Casanova, Lord Byron, Alexandre Dumas e Ernest Hemingway entre muitos outros. Desfrute!
Lugar para se perder e se surpreender
Primeira providência em Veneza é pegar no hotel um bom mapa da cidade. Achar um endereço por lá é missão das mais difíceis. Os pequenos canais, pontes e ruelas formam um verdadeiro labirinto. Não vou dizer para ter cuidado para não se perder porque isso irá acontecer com certeza. Mas aí é que está o charme do lugar. A cada momento descobrirá algo novo e surpreendente antes de chegar ao destino procurado. Acaba sendo divertido. Tenha sempre como referência a Praça de São Marco.
Se não estiver com o orçamento curto não deixe de fazer um tour nas famosas gôndolas, símbolos da cidade. Não é barato – cerca de 80 euros mas vale muito à pena. Se estiver com mais pessoas o preço individual cai, pois elas transportam até seis passageiros. Casais apaixonados nem olham o preço. É puro romantismo. Se estiver sozinho pode recorrer ao aplicativo “Go, Gondola”, idealizado por um brasileiro que promove o encontro de turistas interessados em dividir o passeio. São seis os roteiros possíveis e com duração entre 30 e 45 minutos. Alguns gondoleiros (gondolieris) cantam durante o trajeto, mas todos gritam para evitar colisões nas curvas cegas.
Fique ao menos dois ou três dias para poder passear e visitar com tranquilidade os principais pontos turísticos. A principal “avenida” da cidade é o Grande Canal, que tem 4 quilômetros de extensão e largura de 30 a 70 metros. Ele começa em Punta della Dogana e é cortado por quatro pontes: Accademia, Rialto, Scalzi e Constituição.
Principal ponto turístico da cidade, a Praça de São Marco – é, sem dúvida, uma das mais bonitas de Veneza e da Itália. Ela é formada por construções históricas como a Basílica de São Marco, o Palazzo Ducale, a Torre do Relógio (dell”Orologio) construída no século 14 e o Campanário (Campanille di San Marco), a torre de 99 metros construída no século 9 que guarda os sinos da basílica. Tem ótimos restaurantes e cafés. Mas prepare-se para dividir o espaço com a multidão que visita a praça diariamente – cerca de 50 mil turistas de todas as partes do planeta. Quando visitei Veneza pela segunda vez era o período chamado acqua alta que causa alagamentos. Atravessei a praça com água quase na altura dos joelhos. Mas não se preocupe porque a cidade está preparada e passarelas são colocadas para que os visitantes não molhem os pés.
A Basílica de São Marco (Basilica di San Marco) foi construída no ano 828 para guardar os restos mortais de São Marcos. Tem cinco lindas cúpulas que misturam estilos bizantino, românico e renascentista. Possui um coro elevado acima de uma cripta e colunas decoradas com relevos do século 11. O retábulo é a famosa Pala d´Oro – um trabalho em metal bizantino de 1105. Os dois púlpitos de mármore da nave são ornamentados com estatuetas dos irmãos Massegne. Chama a atenção os objetos utilizados na decoração e que eram trazidos de várias partes do mundo pelos navios que retornavam à cidade. Destaque para os cavalos de bronze que ornamentavam o hipódromo de Constantinopla (atual Istambul). O interior é revestido do piso ao teto por mais de 8 mil metros quadrados de mosaicos recobertos de camadas de ouro 24 quilates. O piso do século 12 é uma mistura de mosaico e mármore em padrões geométricos.
Entre as quase duas centenas de pontes que cruzam os canais do destino, duas delas recebem maiores atenções dos turistas: a de Rialto e a dos Suspiros. A primeira é um dos pontos mais tradicionais e também a mais antiga. Ela cruza o Grande Canal e foi a primeira construída com pedras no século 16. Casais apaixonados costumam colocar cadeados com seus nomes na ponte e jogam as chaves na água. No seu entorno funciona um pequeno centro de compras com diversas lojas e barracas. Nas imediações está, também, o principal mercado local, uma boa opção para quem quiser comprar queijos, embutidos, verduras e frutas frescas.
A Ponte dos Suspiros (Ponte dei Sospiri) liga o Palazzo Ducale ao prédio onde funcionava uma antiga prisão. Uma lenda local conta que o nome da ponte é em referência aos prisioneiros que ao a atravessarem suspiravam ao verem a cidade pela última vez antes de seguirem ao cárcere.
E suspiros são inevitáveis em quem vai assistir a um espetáculo de ópera no Teatro La Fenice, o principal teatro lírico de Veneza, que foi destruído várias vezes e reconstruído. A última grande tragédia aconteceu na década de 1990, quando foi completamente consumido por um incêndio. Após oito anos de obras que custaram 90 milhões de euros, foi reinaugurado em dezembro de 2003 com um concerto dirigido por Riccardo Muti.
Museu a céu aberto
Palácios, igrejas e outros antigos edifícios formam, naturalmente, um verdadeiro museu a céu aberto em Veneza. Quem aprecia artes e adora visitar museus não vai se decepcionar na cidade. O roteiro inclui o Palazzo Ducale, a Galeria da Academia (Gallerie dell’Academia), a Coleção Peggy Guggenheim, o Ca’ d’Oro e Punta della Dogana, entre outros.
Palazzo Ducale – O elegante edifício na Praça de São Marco foi a casa dos governantes locais, os poderosos doges da República Veneziana, entre os anos de 697 a 1797. A construção gótica com delicadas colunas e fachada com mosaicos em rosa e branco tem cômodos decorados com ouro e pinturas. Tem até uma sala de torturas. O maior dos aposentos é o Maggior Consiglio, onde está o imenso quadro Paradiso (inspirado no Paraíso de Dante) de Tintoretto. No andar de cima fica o sótão-prisão onde Casanova foi confinado em 1756 – e fugiu.
Galeria da Academia – Localizada junto à igreja de Santa Maria della Carità Farto e do mosteiro de Canonici Lateranensi, projetados por Andrea Palladio, possui um vasto e interessante acervo de artistas de Veneza e do Vêneto, do século 14 ao 18. Entre os destaques estão obras de Tintoretto, Ticiano, Tiepolo, Veronese e Canaletto, entre outros.
Coleção Peggy Guggenheim – Inaugurado em 1951, no Palazzo Venier dei Leoni, um imponente edifício do século 18, reúne em seu acervo importante coleção de arte do século 20, incluindo obras de Miró, Pollock, Dalí e Magritte.
Ca’ d’Oro – Palácio do século 15, está no distrito (sestiere) de Cannaregio e voltado para o Grande Canal. Guarda a coleção de arte de Giorgio Franchetti que inclui peças em bronze, esculturas, pinturas (venezianas e flamengas) e tapetes. No seu pátio interior a atração é o poço renascentista em brocatello – mármore italiano de cores variada.
Punta della Dogana – A antiga casa da alfândega atualmente é uma importante área de exposição de arte contemporânea com uma exposição permanente da coleção da Fundação François Pinault.
Aproveite para conhecer a igreja Santa Maria della Salute nas proximidades. Erguida no século 17, abriga obras de Tintoretto e Ticiano.
Outra igreja que vale uma visita é a San Giorgio Maggiore. Projetada pelo famoso arquiteto italiano Andrea Palladio, foi concluída em 1610. Seu design clássico renascentista tem fachada de mármore e altas colunas simétricas. Está localizada em uma ilha em frente à Praça de São Marco. Para chegar até lá basta pegar um vaporetto, barco que funciona como ônibus no transporte coletivo local.
Vidros coloridos e carnaval de máscaras
Veneza está rodeada pelas ilhas Burano, vilarejo de pescadores com casinhas coloridas e famosa pela produção de rendas; Murano, pelas fábricas de vidros; Pellestrina, caracterizado por dunas e palhetas; e Torcello, uma das comunidades mais antigas na área. Murano é a mais procurada pelos visitantes por causa das famosas peças produzidas em vidros coloridos. Distante apenas 2 quilômetros e acessível por vaporetto, tem lojas especializadas, fábricas e um museu dedicado ao vidro (Museo dell’Arte Vetraria). Desde o século 13, os cristais são produzidos com técnicas passadas de geração em geração, onde o material é moldado em altíssima temperatura apenas com o sopro e movimentos manuais.
Em Veneza as praças são chamadas de campo – com exceção da São Marco. A Campo Santo Stefano, localizada próximo da ponte dell’Accademia, vale uma visita. Ao seu redor estão palácios, galerias de arte, casas coloridas, bares, cafés e a igreja de Santa Maria della Salute construída no século 17. E, nas proximidades, o Palazzo Grassi, outro palácio com importantes exposições de arte.
Mas a cidade não é famosa apenas por sua arquitetura e ser a preferida dos casais apaixonados. O carnaval veneziano é um dos mais antigos e tradicionais do mundo por causa das belas máscaras, que teriam sido utilizadas pela primeira vez no século 13. Porém, durante muitos anos, a prática foi proibida e quem se atrevia a sair mascarado às ruas acabava na prisão. Elas eram confeccionadas artesanalmente com papel machê sobre moldes de rostos feitos de argila.
A folia veneziana também tem origens religiosas e acontece sempre no final de fevereiro e começo de março. Tal como no Brasil, a festa se espalha pelas ruas e com atrações musicais, além de locais privados com ingressos caríssimos.
Para comprar ou apenas conhecer como são produzidas as máscaras, o lugar mais famoso da cidade é a loja Ca ‘Macana (camacana.com), em Dorsoduro. Saíram de lá as utilizadas por Stanley Kubrick no filme “De Olhos Bem Fechados”, bem como outras, exclusivas, para apresentações no Wiener Staatsoper, o teatro de ópera mais importante de Viena. É possível participar de oficinas de pinturas de máscaras mediante agendamento prévio.
Como chegar
Não há voos diretos do Brasil para Veneza. A Alitalia (alitalia.com/) oferece voos diários e diretos para Roma a partir de São Paulo e Rio de Janeiro. Pela Royal Air Maroc (royalairmaroc.com) saem 5 voos semanais de São Paulo e 2 do Rio de Janeiro para Casablanca, no Marrocos , e de lá para Veneza. Se estiver em Roma, Milão ou Florença a melhor opção é o trem. A partir das principais capitais europeias é melhor pegar um voo direto.
Onde ficar
Hospedagem em Veneza de maneira geral custa caro. Há, claro, opções mais econômicas em pensões simples, porém, é necessário levar em conta a distância dos principais pontos de interesse e como chegar até eles. Os melhores estabelecimentos estão em antigos palácios totalmente restaurados e adaptados com as conveniências modernas.
Onde comer
Veneza oferece opções para todos os bolsos. Você encontra sem muito esforço bons locais para uma pizza al taglio – pedaços de pizzas espessas e quadradas – ou um jantar estrelado regado a um bom vinho italiano. Os peixes e frutos do mar são abundantes na região de Vêneto e, ideais para acompanhar uma massa, arroz ou polenta. Entre os pratos típicos venezianos estão o risoto negro, o escabeche de sardinha, o antipasti (azeitonas, anchovas marinadas e frutos do mar) e cichéto (petiscos). Para beber experimente o spritz, drinque preparado com vinho branco, campari e água com gás.
Texto por: Roberto Maia
Foto destaque por Istock/ Freeartist