Valle do Maipo, na capital chilena, é um dos principais produtores do país, mas regiões afastadas e frias ajudam a fazer o país sul-americano ser um dos principais exportadores da bebida do mundo
Quase toda adega de vinho no Brasil tem, entre as garrafas nacionais, alguma bebida produzida no Chile. Nosso país é, ao lado dos Estados Unidos e da China, o maior importador de vinhos chilenos, mesmo consumindo uma quantidade inferior em relação ao feito na região Sul.
Segundo o Wine Institute, responsável pela expansão da produção do país sul-americano para o mundo, 53% das bebidas consumidas no mercado brasileiro são originárias das vinícolas da nação vizinha.
A produção de vinhos chilenos se distribui pelos 11 vales que ocupam quase todo o Sul do território do país, mas apenas alguns deles são vendidos aos consumidores brasileiros.
A região mais conhecida nos últimos anos pelos amantes da bebida é a de Maipo, entre a capital Santiago e Valparaíso e Viña del Mar, no litoral. Foi nesse vale que, nos anos 1990, o ampelógrafo francês Jean-Michel Boursiquot redescobriu a uva carménère sendo catalogada pelos cultivadores como merlot. Ela havia sido considerada extinta na França, de onde é originária, ainda no começo do século 20.
Os vinhos chilenos, contudo, seguem uma rota que vai tornando a produção cada vez mais “fria”: se em Santiago e em regiões próximas o clima é relativamente estável e úmido, por conta da localização geográfica com a Cordilheira dos Andes e com o oceano ao mesmo tempo, os vales mais ao sul são mais frios e molhados.
Um desses vales é o de Bío-Bío, nome também do rio já na fronteira austral entre Chile e Argentina, a cerca de 500 quilômetros de Santiago. Ali, na última rota de vinhos chileno, se produz um microclima particular, ideal para o cultivo de variedades brancas e tintos de ciclos mais curtos.
Para atrair turistas, as vinícolas passaram a promover atividades como excursões a cavalo ou em bicicleta por plantações de uvas, assim como passeios de barco pelo rio Bureo.
“A vinicultura em Bío-Bío requer mais paciência, habilidades e determinação do que qualquer outro vale chileno. Um punhado de cultivadores aceitou o desafio e tem plantado na região variáveis próprias de climas frescos, como sauvignon blanc e chardonnay. Os primeiros resultados premiam o esforço: os vinhos de Bío-Bío são atrativos e contam com uma fresca acidez natural”, diz um artigo do famoso site Bodegas y Viños.
Vizinho do vale de Bío-Bío está o de Itata, com dias mais quentes e noites frias e úmidas, além de chuvas mais constantes no inverno. Assim como na sua fronteira, também tem um solo rico de minerais por conta da proximidade com o mar, mas a diferença é que em Itata há extensos bosques entre as montanhas da Cordilheira e o oceano. É uma das regiões mais frutíferas de todo o Chile, com castas cabernet sauvignon, carménère, merlot, tintórera, semillón, chardonnay e sauvignon blanc.
Ao contrário de Bío-Bío – e da maioria dos vales chilenos –, a região de Itata – responsável por 80% do mercado de vinhos no país – já não produzia vinhos desde 1920, quando um programa do governo há 15 anos incentivou os primeiros cultivadores a assentarem-se novamente na região.
Antes, a facilidade encontrada em regiões mais quentes, como a de Maipo, fez com que Itata fosse esquecida. Curiosamente, foi nesses bosques que se começou o cultivo de uvas para a produção de vinhos no Chile, com os jesuítas europeus, no século 16.
“O Vale de Itata goza das melhores condições de clima austral para a produção de vinhos com um DNA único. Banhado pelos rios Bío-Bío e Itata, possui solo granítico, rico em minerais, que alimenta esses vinhedos orgânicos, com cercas construídas ‘en cabeza’ – que se irrigam naturalmente com água de chuva graças ao seu solo seco”, salienta o sommelier chileno Hector Riquelme. Hoje, é no vale se que produz dois tipos exclusivos de vinho: o cinsault e o país.
Outro vale que também possui uma das primeiras explorações de vinho do Chile e da América do Sul é o de Maule – hoje, a região que possui a maior área de cultivo de uvas do país, com 31 mil hectares de plantações. Ali, o clima já é mais fresco, com um solo ácido e com mais presença de argila que, se por um lado reduz a produtividade, por outro aumenta a qualidade da fruta.
É a região ideal para produção dos tradicionais vinhos cabernet sauvignon, merlot e malbec. Segundo o site especializado Trekking Chile, o vale de Maule se divide em três zonas de cultivo: o de Rio Claro, o de Loncomilla e o de Tutuvén, este último com uma característica própria: o cultivo seco de vinhas, cuja única irrigação é a da chuva.
Por fim, já se aproximando de Santiago e, portanto, numa área menos fria do Chile, se estabeleceu nos anos 1980 o Valle de Curicó. O enólogo espanhol Miguel Torres foi pioneiro em diversas técnicas de armazenamento de uvas, o que gerou um importante avanço não apenas para a região, que não produzia vinhos, como para as próprias técnicas do Chile com seu produto.
Hoje, é em Curicó que se localiza a maior vinícola do país: a Viña San Pedro. Durante março e abril ela realiza o que também se considera a maior festa temática do Chile, com atividades tradicionais como pisar nas uvas e eleger a rainha da vinícola.
Texto por: Agência com edição Eliria Buso
Foto por IStock/ToniFlap