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Estatal ferroviária é aposta para impulsionar o turismo

Uma grande articulação pela criação de uma política nacional de desenvolvimento ferroviário no Brasil teve início na última terça-feira (12). Durante a 29ª Semana de Tecnologia Metroferroviária, realizada em São Paulo (SP), o presidente da Frente Nacional pela Volta das Ferrovias (Ferrofrente), engenheiro José Manoel Ferreira Gonçalves, defendeu a criação de um amplo sistema de trens de passageiros em todo o País, gerido por uma empresa estatal. As ações devem beneficiar outros setores da economia, em especial o turismo, já que o Brasil conta com uma grande extensão de trilhos subaproveitados ou ociosos.

“O Brasil tem 21 mil km de estradas de ferro em operação. Isso é menos de 10% do que existe na Europa ou nos Estados Unidos e é uma malha menor que a de países como a Argentina, França e África do Sul”, explica Gonçalves.

Para impulsionar as ferrovias no setor turístico, ele aponta a necessidade de retomar o transporte ferroviário de passageiros. “Precisamos praticamente começar do zero, com estímulo constante à concorrência. Nos EUA, as linhas são controladas por cerca de 600 firmas privadas, mas o estado exerce um papel fundamental para garantir a expansão das ferrovias e os bons resultados das operações”, explica.

Ele também cita o Japão como outra fonte de inspiração para criar um modelo brasileiro, calcado nos trens de alta velocidade. “As admiráveis ferrovias japonesas definiram, ainda na década de 1960, um modelo de intervenção estatal no transporte ferroviário de passageiros e cargas, que tem sido adotado com resultados variados em economias tão diversas quanto Canadá, China, Coreia do Sul, União Europeia e Tailândia”.

Propostas

O presidente da Ferrofrente detalhou a proposta durante a palestra “Conselhos Gestores como suporte para o ingresso e maior protagonismo do setor ferroviário”, ministrada na tarde desta terça-feira, durante o evento promovido pela Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô.

A Semana de Tecnologia Metroferroviária reuniu alguns dos principais players do setor, tanto do setor público quanto privado, como empresas de logística, estatais de transporte coletivo e fornecedores de produtos e serviços. A defesa de uma nova política ferroviária para o país chamou a atenção do setor e abriu um novo canal de discussão política para o tema das ferrovias.

“Em todo o planeta, considerando os países com dimensões continentais, Brasil possui um atraso de mais de 50 anos no setor ferroviário. Além disso, é o único país do mundo que não oferece trens para viagens de passageiros em longas distâncias”, afirmou o presidente da Ferrofrente.

Gonçalves frisou que a recuperação desse tempo perdido não se faz sem investimentos, mas requer disponibilidade para o debate em busca do modelo ideal para o Brasil. “Precisamos da sociedade civil também unida para reconhecer que o serviço poderá transformar a realidade de muitos municípios, levar desenvolvimento, gerar emprego e renda. É preciso avançar no debate sobre a essencialidade dos serviços e nos projetos que atendem a todos os cidadãos brasileiros”.

Durante a palestra, Gonçalves destacou a necessidade de criar uma empresa estatal para gerir as ferrovias brasileiras. Segundo ele, existe uma opção moderna e eficaz. “Vale dizer que temos um ponto de partida. Há modelos adotados em países e continentes com realidades muito distintas, mas que já reconheceram a necessidade de o estado intervir para garantir investimentos no setor”.

Ele citou, como principais exemplos desse modelo, países tão díspares quanto a China, com políticas fortemente calcadas pelo planejamento estatal, quanto os Estados Unidos, conhecido pelas suas práticas liberais e incentivo à iniciativa privada.

“A estatal dos EUA, a Amtrak, já prevê o repasse de 3,4 bilhões de dólares em 2024. Trata-se de um modelo de gestão ferroviária com mais de 50 anos, gestado pelo Congresso americano, durante o governo do (ex-presidente Richard) Nixon”.

Ele também citou Canadá, Índia, Coréia do Sul e Rússia como outros bons exemplos. “Esses são países que adotaram as suas estatais, que repassam periodicamente recursos financeiros para as operações ferroviárias”.

Estudo aprofundado

A defesa de uma nova política para as ferrovias tem como base um estudo feito pelo economista José Tavares de Araújo, falecido recentemente, intitulado “Perspectivas do setor ferroviário no Brasil: um confronto com o resto do mundo”. O trabalho foi apresentado ao então secretário Nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro e marcou um passo importante para a adoção de uma nova política ferroviária no país.

O levantamento traz um raio-x do setor ferroviário no país, suas potencialidades e fragilidades, bem como os vetores que devem ser enfocados nesta nova política ferroviária proposta pela Ferrofrente.

Entre os pontos destacados no estudo, também está a importância das ferrovias para a consolidação de uma economia sustentável economicamente. “O mundo também tem olhado para as condições climáticas, para o dever de criar políticas sustentáveis. A ferrovia é um modal que acompanha essa dinâmica para o desenvolvimento, com menos carbono”, pontua Gonçalves.

Durante a palestra, ele apontou alguns fatores que emperram o desenvolvimento ferroviário do país:

Malha ferroviária de pequeno porte – “Considerando a extensão total da malha ferroviária no Brasil, ainda estamos abaixo de países como a Argentina, França e África do Sul. O Brasil tem 21 mil km de estradas de ferro em operação. Isso é menos de 10% do que existe na Europa ou nos Estados Unidos, por exemplo.”

Pequena fração de movimentações – “Na comparação de matrizes de transporte de carga apenas 17% das movimentações são feitas por ferrovias aqui. Esse percentual é bem maior na Austrália, com 43%, na China, 37% e Canadá (46%). A falta de vagões faz com que a produção seja escoada pelas rodovias, mantendo altos os índices de impacto ambiental e desfavorecendo as estatísticas sociais para o desenvolvimento das cidades.”

Pouca diversidade no transporte de cargas – “Enquanto nos EUA e Europa são movimentadas uma grande diversidade de cargas, aqui, os minérios são cerca de 70%. Grãos ocupam entre 10% e 17%.”

Forte concentração do setor– “Precisamos encontrar saídas para variação de players. Atualmente, nossas ferrovias são controladas por quatro grandes companhias (Rumo, MRS Logística, VLI, Vale), que percorrem menos de 40% do território brasileiro, para escoar minérios e produção agrícola, em grande parte. Em outros países, que incluem os serviços de transportes de passageiros, há um estímulo constante à concorrência”.

Quem é o engenheiro José Manoel

Eng. José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro civil, advogado, jornalista e escritor. Pós Doutorado em Sustentabilidade e Transportes, pela Universidade de Lisboa, em Portugal. Doutor em Engenharia de Produção. Mestre em Engenharia Mecânica. Idealizador e presidente da Ferrofrente – Frente Nacional pela Retomada das Ferrovias e da Aguaviva – Associação Guarujá Viva. É diretor de relações jurídicas e legislação da FNE – Federação Nacional dos Engenheiros e Conselheiro do Movimento EngD, Engenharia pela Democracia. Concorreu à presidência do Crea-SP nas eleições de 2020 com uma proposta de fortalecimento da engenharia do Estado e do País e da defesa dos interesses dos profissionais registrados no sistema Confea/Creas.

Texto por: Agência com edição de Cláudia Costa

Foto destaque por: Divulgação VLI

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