A leste, a fronteira com a Argélia. A oeste, o oceano Atlântico. Ao sul e sudeste, Mauritânia. Mas o norte, ah, o norte de Marrocos. De tão estratégico, já dominado pelos fenícios, pelo Império Romano e Bizantino, árabes, portugueses, ingleses, franceses, até conquistar sua independência em 1956. Porém, a região continua cercada de beleza.
Além do mar mediterrâneo, a cadeia de montanhas Rif são guardiãs de lugares ímpares, cuja diversidade geológica, paisagem, flora e fauna, além de sua história e da bela tradição oriental se desponta no belo continente africano. Conheça cinco cidades dessa região: Chefchaouen, Tânger, Tetouan, Tamuda Bay e Ackor.
Chefchaouen- A cidade azul
Sobre as montanhas do Rif, a 110 km de Tânger, a fotogênica Chefchaouen. O aspecto único da cor azul turquesa irradiando de paredes e muros a distingue de todas as outras cidades marroquinas.
O frescor da tonalidade azul vai além dos muros, casas e vielas de Chefchaouen. Ele também está presente nas vestes tradicionais das mulheres: tons de azul em cima e como saiote uma colcha de listras azuis e vermelhas em baixo. O chapéu de palha complementa os efeitos.
Há algumas versões sobre a predominância do índigo. Fundada em 1471 pelos mouros como fortaleza para barrar a expansão dos portugueses que vinham do norte de Marrocos, Chefchaouen virou no século XV reduto de judeus e europeus, devido à Inquisição Espanhola. A permanência se manteve significativa até meados do século XX.
Na década de 30, os judeus teriam começado a pintar as casas para lembrar a antiga tradição das vestes dos reis do Antigo Testamento, cujos trajes eram tingidos com corantes azuis, derivados de caracóis e mariscos. Há outras versões. A cor azul das casas serviria de lembrete de que Deus e o céu estão acima de tudo. Ou, simplesmente a reprodução do paraíso na terra. Também se diz que a cor, usada para tingir objetos sagrados no Velho Testamento, serviria como constante lembrança do poder de Deus sobre o grupo de refugiados.
Em suma, o azul se tornou sagrado naquela época para a cultura religiosa judaica, porém, o sentido religioso também se diluiu no cal com o passar dos tempos. A comunidade já não é maioria como outrora. Chefchaouen mantém as vielas tingidas de azul como atrativo turístico, enquanto o cal da pintura espanta os mosquitos.
No centro histórico, as ruas estreitas impossibilitam o trânsito de automóveis. Em algumas delas o número de visitantes obriga a andar devagar. Mas, pressa para quê? O labirinto de vielas e ruazinhas completamente azuis traz a sensação de que o vilarejo está no céu.
Chefchaouen se tornou uma das cidades mais visitadas de todo o país. As lojas oferecem artesanato local: colchas, mantas, casacos e gorros feitos com padrões típicos da região. Na zona do rio quase sempre se encontram lavadeiras. Há lugares únicos, onde a interação com os locais pode se tornar constante e tomar muito tempo.
Em Chefchaouen se pode visitar o castelo na praça central, a mesquita com o minarete octogonal (o único em todo o mundo muçulmano), entre outros tantos lugares sagrados: há 20 mesquitas, 11 Zaouias (edifício religioso muçulmano) e 17 mausoléus. Cinco vezes por dia os auto-falantes anunciam o momento de oração.
Os restaurantes são imensos, servem pratos típicos como cabrito, cuscus, vitela, peixe etc. Em diversos pontos da cidade são servidos o famoso chá de menta marroquino.
A cidade Azul é também ponto de partida para conhecer a estonteante cadeia de montanhas do Rif, área de cume pouco elevado, com caminhos que dão acesso a cascatas, enseadas isoladas, bosques de cedro e pinheiros. Os arredores montanhosos de Chefchaouen (chauen, em espanhol, significa “chifres”- referência ao formato de duas montanhas de onde se avista a cidade) oferecem diversas trilhas e até lindos mirantes, de onde é possível admirar a paisagem estonteante do norte do Marrocos e ter uma visão panorâmica do centro histórico azul da cidade.
É moda para os marroquinos o uso da «djellaba”. A peça de roupa com tem com capuz e cobre o corpo inteiro, os tornando semelhantes a um mago do Senhor dos Anéis.
Tânger, a “Porta da África”
Na costa atlântica do Continente africano, a 60 km de Gibraltar, uma das cidades mais vibrantes, misteriosas e multiculturais de Marrocos: Tânger – resultado da mistura de culturas europeia, africana e marroquina.
Algo único: bazares tradicionais, músicos, lojas, encantadores de serpentes e mesquitas fizeram de Tânger uma das mais interessantes cidades do mundo. O Grand Zoco, ou mercado, no centro, é um dos pontos de partida para um bom passeio. Há perfumes, lenços, chás, joias e Cafés. No Zankat Salaheddine e no Zankat el Qualili há alimentos repletos de cores e aromas.
Situada no topo noroeste da África, na costa atlântica e na entrada ocidental, o estreito de Gibraltar une o Atlântico ao Mediterrâneo e separa Marrocos de Espanha. Em linha reta, são 14 quilômetros de distância da península Ibérica. O farol do Cabo Espartel observa imponente a união das águas turquesas do mar e os tons escuros do oceano.
Em Tânger, o moderno e o antigo se conjugam. A cidade se desenvolveu rapidamente nas últimas décadas e se modernizou. Há hotéis luxuosos. Ao longo da extensa baía, margeada por uma praia, o moderno bairro de negócios (Tangier City Center) abriga hotéis luxuosos, novo terminal de aeroporto e recente estádio de futebol.Em contraste com a modernidade, e bem próximo ao Grand Zoco, o Museu da American Legacy, criado como reconhecimento da independência de Marrocos pelos Estados Unidos, expõe fotografias históricas da cidade e traça a história da relação entre o país norte-americano e Marrocos.
A Kasbah, edificada no séc. XVII, é um castelo fortificado no ponto mais alto da cidade, onde vivia o sultão. O local oferece vista sobre o Estreito de Gibraltar e para a vizinha Espanha. Isolada da cidade por uma parede, o grande pátio conduz ao palácio Dar el Makhzem, transformado em Museu de Arte contemporânea de La Ville de Tânger. Os jardins, entre as árvores frutíferas e ervas aromáticas, transformam esse espaço num dos mais agradáveis de Tanger.
Na cidade há ainda o Museum of Antiquities – The Voyage of Venus, onde está a famosa casa do mosaico conhecida como a “Viagem de Vênus” – retrato da deusa e um grupo de ninfas num navio.
O Palais Mendoub – antiga residência do editor americano Malcolm Forbes, abriga o Forbes Museum of Military Miniatures, onde estão reunidas mais de 115 mil miniaturas de soldados de chumbo e um jardim com 600 estatuetasem homenagem à Batalha dos Três Reis.
As ruas estreitas da cidade, verdadeiros labirintos, conduzem a edifícios de importância religiosa. Há mesquitas e minaretes por toda a parte.
Aliás, o nome Tânger é originário da mitológia greco-romana: Tinjis (ou Tinge), foi a esposa de Héracles (Hércules, para os romanos). Da união nasceu Sufax, que fundou a cidade e deu à ela o nome de sua mãe.
O porto de Tânger é outro belo local para passeio. Sua história está ligada a registros históricos e arqueológicos que remetem a indícios de ocupação pré-histórica e sinais da presença fenícia (duas necrópoles). O porto de Tânger é altamente estratégico: próximo ao grande continente e junto ao Estreito de Gibraltar. A cobiça pela região é antiga: antiga cidade fenícia, foi fundada por colonos cartagineses no século V a.C., dominada e colonizada pelos romanos no século I a.C., se tornou a capital da província romana da Mauretânia Tingitana, depois foi invadida pelos vândalos da Península Ibérica, após cem anos fez parte do Império Bizantino, caiu sob o domínio árabe, foi tomada pelos portugueses em 1471, cedida aos Ingleses em 1661 e, em 1684, a cidade foi recuperada sob o reino de Moulay Ismael, da dinastia Alauita.
Fora da cidade se encontra o Atlas, um dos lugares mais impressionantes de Tânger, cercado por vales deslumbrantes e estradas com vistas panorâmicas. A cerca de 20 quilômetros está a Todra Gorge – uma incrível estrutura de rocha de 300 metros de altura circundada por um rio. A Gruta de Hércules é também uma das principais atrações turísticas de Tânger. Trata-se de um conjunto de túneis naturais formados pelo mar.
A gruta, situada a poucos quilômetros a sudoeste da cidade, perto do cabo Espartel, marca a entrada do estreito de Gibraltar (Colunas de Hércules na Antiguidade). A lenda diz que Hércules teria passado a noite ali antes de realizar o último dos seus doze trabalhos, o roubo das maçãs do Jardim das Hespérides. O geógrafo romano do século I d.C., Pompônio Mela, relata que na cidade se conservava o enorme escudo de Anteu, em pele de elefante, objeto venerado pelos habitantes.
A intocável Tetouan
Bem próximo às montanhas do Rif, um cenário incomparável: tons verdes de cipreste contrastam com casas brancas e baixas da capital do norte de Marrocos, Tetouan.
Uma das mais completas e intocadas cidades antigas de Marrocos é considerada patrimônio mundial da Humanidade pela Unesco. Fundada pelos Merinies por volta do ano 1305 como base de operações militares, a cidade foi destruída pelos espanhóis. Recuperou sua notoriedade no século XVI, quando serviu de exílio para muçulmanos e judeus vindos de Andaluzia, Espanha, e prosperou durante o reinado de Ismail.
Muitos monumentos seculares transformaram Tetouan em um dos principais centros culturais de Marrocos, como a casa dos califas e sua majestosa arquitetura hispano-marroquina do século XVII. Acessível por sete portas e rodeada por uma muralha de cinco quilômetros, o passeio pelo centro histórico leva a pequenas praças e jardins bastante limpos e bem tratados ao longo das avenidas e ruas estreitas e sinuosas cercadas de paredes brancas. Andaluzia parece ter se estendido até a praça Hassan II, no coração da de Tetouan, onde fontes, quiosques e flores se tornam semelhantes às da cidade espanhola. O centro histórico permanece vivo em suas tradições: ruas repletas de vendedores de frutas, legumes, mobílias, roupas etc. De manhã é comum ver mulheres de trajes em cores extravagantes e grandes chapéus de palha. No mercado, elas vendem manteiga, mel, legumes e ervas.
O agradável aroma de especiarias envolve certas ruas da cidade. Por sinal, a atividade comercial é marcante em todas as ruas. A dos tintureiros, na encruzilhada das ruas dos joalheiros e dos artesão, são exemplo dessa distinção. Por sinal, as oficinas dos artesãos geralmente estão agrupadas em áreas específicas: a zona dos curtumes, a rua dos carpinteiros, dos joalheiros e por aí vai. Há também inúmeras barbearias, além de oficinas (que não passam de mini lojinhas). No entanto, é comum ver os trabalhos dos artesãos serem desenvolvidos também na rua. Por fim, vendedores ambulantes de peixe, frutas, bolos e doces ajudam a tornar pouco acessível a passagem em certas ruas. Nada mais original.
Em Tetouan também se destaca a Escola de Belas Artes, o conservatório e o Palácio Real, situado numa das saídas da cidade. Há ainda a Igreja de Nossa Senhora das Vitórias, de origem espanhola.
Cachoeiras de Akchour têm águas cristalinas
Trinta quilômetros a sudeste de Chefchaouen, a Reserva Nacional Talassemtane guarda uma joia rara: a Cachoeira Alta. Prepare-se para uma grande caminhada de tirar o fôlego.
É como se fosse uma pintura graciosa. As cachoeiras de Akchour encantam apaixonadamente turistas, caminhantes e aventureiros de todo o mundo, especialmente no verão. Akchour, palavra bárbara que significa “parte, parte de” ou “algum lugar”, chama a atenção em especial pelas quedas d’água ao longo de aproximadamente cinco milhas da estrada que leva a um estacionamento. A partir dali, a caminhada se estende por mais uma hora através da selva densa até a Cachoeira Baixa, com queda de aproximadamente 20 metros. As “Cascades d’Akchour” consistem basicamente de duas cachoeiras, a primeira, a Cachoeira Baixa e a segunda, a Cachoeira Alta. Entre elas, pelo caminho, há outras, de porte bastante modesto e algumas cascatas que compartilham o mesmo fluxo das principais cachoeiras. Na região também se vê a Ponte de Deus (Le Pont de Dieu), uma impressionante ponte natural.
Para chegar à cachoeira Alta, a mais famosa, são necessárias mais duas horas extenuantes de caminhada por entre trilhas, pistas empoeiradas e numerosos obstáculos rochosos. Em todo o caminho há abrigos em ambos os lados, onde o caminhante irá repor sua energia com água potável, sucos e alimentos. Ao final do percurso, a recompensa pelo esforço: a Cachoeira Alta. Pela frente, a fresca sombra da cachoeira e a água jorrando a mais de 100 metros de altura. De tirar o fôlego.
O tesouro de Tamuda Bay
A costa do Mediterrâneo descobriu recentemente um belo tesouro: areias douradas, praia cristalina e clima agradável. Tamuda Bay se tornou destino precioso de turistas em busca dos lugares maravilhosos do norte de Marrocos.
A praia é longa e arenosa. A brisa suave alivia o calor. Próximo ao aeroporto de Tânger, Tamuda Bay é considerado ainda um empreendimento relativamente novo. Porém, a abundância de hotéis de alta qualidadee resorts junto à praia já é uma das razões da alta popularidade do local entre os turistas e os moradores locais. A região se tornou uma boa alternativa para além de caminhadas por entre as belas montanhas do Rif. Há muito que se fazer: campo de muita diversão: campo de golfe (de 18 buracos) esportes aquáticos, mergulho, surfe, compras etc.
A cidade contempla ainda a Lagoa Smir, um parque aquático com lojas, restaurantes e dois portos de recreio: Marina Kabila e Marina Smir. À beira do lago estão disponíveis equipamentos para esportes aquáticos e o thalassotherpy Centre, área de relaxamento que associa técnicas de massagem ao uso de algas marinhas e sais minerais. No programa, o turista ainda poderá desfrutar de passeios relaxantes sobre a longa e bela estrada da costa e mergulho na Marina Smir.
O porto de M’diq é ideal para jantares românticos de verão. Após a refeição, Tamuda Bay oferece turista o prazer de passear pelas ruelas da aldeia e caminhar entre os barcos tradicionais construídos pelos pescadores de M’diq. Nas imediações, o farol Cabo Negro reserva vistas espetaculares. Há muitos tesouros expostos em Tamuda Bay.
Texto por: Pedro Teixeira
Foto destaque por IStock/ mrsixinthemix